O lado obscuro do Vaticano em "O Poderoso Chefão III"
Acordo milionário com a máfia, complôs, assassinatos... Bastidores da igreja católica na versão de Mario Puzo adaptada para o cinema

Por Landim Neto, editor do site. Atualização: 23 de abril, às 14:23
as cenas iniciais de "O Poderoso Chefão — Desfecho — A Morte de Michael Corleone", lançado em 2020, o mafioso mais icônico da trilogia homônima aparece tranquilo em uma sala suntuosa — onde negocia com o arcebispo Gilday. Este, visivelmente tenso e fumando um cigarrinho, convence Michael a cobrir um rombo de 600 milhões de dólares no Banco do Vaticano, então em crise por causa de corrupção, inclusive do próprio religioso.
Em troca da volumosa quantia, o arcebispo prometia interceder junto ao papa Paulo VI para tornar o personagem de Al Pacino sócio majoritário da Immobiliare, uma corporação milionária da qual a igreja católica detinha 25% do patrimônio. Isto permitiria que o já cansado mafioso "lavasse toda a sua história de crimes e de sua família", nas palavras do próprio Gilday.
No seguimento, Michael Corleone está numa festiva comemoração com familiares e amigos, onde recebe a Ordem de São Sebastião, importante comenda que lhe fora concedida por Paulo VI, após o então Santo Padre ser convencido pelo arcebispo fumante. O "dando que se recebe" entre a máfia e o Vaticano começa a ser exposto na versão literária de Mario Puzo, adaptada para o cinema por Francis Ford Coppola.

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O filme de Coppola e outras obras sobre os bastidores da igreja católica estão sendo bem lembrados nos últimos dias por conta do óbito do papa Francisco, aos 88 anos. Subtítulo de matéria da Revista Exame desta terça-feira (22) diz sobre isso "que audiência [do filme Conclave no Prime Vídeo, por exemplo] teve aumento de 238% desde a última segunda-feira, 21, data de falecimento do pontífice." A mesma postagem revela também que, "na Netflix, Dois Papas registrou aumento de 417% de domingo para segunda-feira, com mais de 1,5 milhão de minutos assistidos."
Voltando à versão mais recente de "O Poderoso Chefão III", 2020, vê-se que é mais enxuta que a original, de 1990. "Está de fato muito melhor e mais fácil de assistir do que há 30 anos", diz Ivan Finott, repórter especial da Folha de S.Paulo, 3/12/2020.
A edição deste século ganhou também um didatismo narrativo que deixa mais transparente as relações (perigosas) entre a cúpula da igreja católica e a nata da máfia italiana. Mortes vêm como consequência da parceria.
O lado mais obscuro e violento dessa relação passa a ser exposto quando Michael Corleone descobre que o arcebispo Gilday fizera um complô com outros três criminosos (banqueiro suíço Frederick Keinszig, Don Altobello e Don Lucchesi) para roubar o dinheiro que destinara ao Banco do Vaticano. Do trato com o religioso, nada de Immobiliare. O velho Corleone ficaria mesmo só com a comenda da Ordem de São Sebastião. Decide então agir.
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Don Lucchesi, morto com as hastes dos próprios óculos por um agente da família Corleone. Foto/reprodução.
Michael consegue uma audiência com o Cardeal Lamberto, que viria a se eleger papa após a morte de Paulo VI. E explica a situação do golpe que queriam lhe dar.
Logo ao se eleger, o novo pontífice ratifica de imediato o acordo que Don Corleone fizera com o arcebispo Gilday. Novo Santo Padre é envenenado com uma xícara de chá por isso e encontrado morto em seus aposentos. Lamberto é uma figura fictícia que, na trama de Mario Puzo e Coppola, representaria João Paulo I, que morreu 33 dias após assumir o papado em 1978.

Em tal altura, Michael Corleone, cansado e doente, já havia entregue o comando dos "negócios" da família a Vincent Mancini, um sobrinho. O novo chefão planeja e manda assassinar os quatro envolvidos no referido complô: banqueiro suíço Frederick Keinszig, Don Altobello, Don Lucchesi e arcebispo Gilday.

Um detalhe não menos importante na história: quando Michael Corleone é informado que o papa Lamberto havia decidido honrar o acordo dos 600 milhões de dólares, o velho mafioso destacou que o novo pontífice era um homem honesto e de palavra, previu sua morte e disse lamentar não poder chegar a tempo para socorrê-lo. Pelo menos na comparação com Gilday, Michael mostrou-se muito mais digno que o arcebispo encarregado de tomar conta do "dinheiro de Deus".
"O Poderoso Chefão III" — em sua última versão — deixa mais claro assim que, "o mundo das grandes corporações, Vaticano incluso, é tão corrupto quanto o dos mafiosos", tal observa também o repórter especial da Folha. Para quem gosta de histórias com grandes conspirações, gente muito poderosa, pode ver gratuitamente neste link aqui.

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