Discursos de ódio em ambientes digitais

25/12/2025
As novas tecnologias trouxeram inúmeros benefícios, mas é fato que também se tornou um espaço para que pessoas, protegidas pelo anonimato, utilizem para expressar ódios, discriminações e incitação à violência

CATEGORIA: POLÍTICA

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Redação Dever de Classe, às 18:10

As novas tecnologias trouxeram inúmeros benefícios com a expansão da internet e das redes digitais, interligando pessoas e facilitando o acesso ao conhecimento. Contudo, é fato que esse ambiente também se tornou um espaço no qual pessoas, muitas vezes protegidas pelo anonimato, passam a expressar ódio, discriminações e incitação à violência.

Segundo dados da SaferNet, ONG criada em 2005 que atua em defesa dos direitos humanos na internet e é constituída por pesquisadores, professores, cientistas da computação, advogados, entre outros profissionais, verificou-se que, a partir de 2018- ano em que um candidato da extrema direita venceu a eleição presidencial e elegeu uma expressiva bancada no Congresso Nacional - até 2023, quando foram divulgados os resultados de um levantamento, triplicaram as denúncias de crimes envolvendo discursos de ódio na rede (intolerância religiosa, racismo etc.). Esses números se ampliam em anos eleitorais: em 2022 foram registradas 74 mil denúncias de crimes de ódio, contra 44 mil em 2021. Registre-se, ainda, que o maior aumento ocorreu nos crimes de ódio contra as mulheres.

Com o objetivo de combater os discursos de ódio nas redes sociais, a Fundação Getulio Vargas publicou o Guia para Análise de Discurso de Ódio, resultado de uma pesquisa realizada pelo Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV/SP em parceria com a Confederação Israelita do Brasil (CONIB). O documento tem como objetivo o "esclarecimento conceitual do discurso de ódio por meio da construção de uma matriz de variáveis que servem para a identificação, avaliação e sancionamento em casos concretos (...), mormente em meios de grande propagação, como as redes sociais, reforçando o desafio de se buscar um instrumental de análise teórico capaz de auxiliar empresas, organizações não governamentais e entidades estatais e comunitárias a lidar, mitigar e solucionar tais casos".

A definição proposta pelo Guia aponta que os discursos de ódio "são manifestações que avaliam negativamente um grupo vulnerável ou um indivíduo enquanto membro de um grupo vulnerável, com o objetivo de estabelecer que ele seja menos digno de direitos, oportunidades ou recursos do que outros grupos e indivíduos, legitimando, consequentemente, a prática de discriminação ou violência". Fundamentalmente, envolvem a restrição de direitos tanto pelo estímulo à discriminação quanto à agressão física, incluindo também comparações degradantes, deboche, negacionismo de situações históricas, insultos, ofensas, calúnias, desqualificação de pessoas, grupos ou instituições, expressões de desprezo, repugnância ou rejeição, xingamentos e apelos à exclusão ou segregação.

Em sociedades com grande polarização política, como o Brasil atualmente, criaram-se também condições para a organização de comunidades especializadas em discursos de ódio, expressas na formação de grupos de extrema direita e nazifascistas que, por meio das redes sociais, ampliaram significativamente seu alcance.


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A expansão das redes digitais trouxe novos desafios, entre eles a necessidade de definir o que pode e deve ser feito para garantir a liberdade de expressão e, ao mesmo tempo, coibir os abusos cometidos em nome dessa liberdade.

Se o Estado deve garantir a livre expressão, não pode nem deve tolerar discursos de ódio ou violentos que ataquem pessoas e instituições democráticas responsáveis por assegurar esse direito. Ou seja, a liberdade de expressão não pode ser exercida de forma abusiva quando fere um princípio fundamental: o da dignidade humana.

Como minimizar ou impedir as condições que facilitam e estimulam o discurso de ódio? Como punir os responsáveis? A tolerância em uma sociedade democrática é fundamental, mas ela, como pressuposto, não pode tolerar o intolerante - ideias, expressões e atos que atentem contra a dignidade das pessoas e estimulem o ódio, o preconceito e a violência.

Nesse sentido, há duas questões relevantes: a necessidade de garantir a liberdade de expressão como valor fundamental da democracia e, por outro lado, a necessidade de dispor de instrumentos eficazes para combater todas as formas de violência e intolerância possibilitadas pelo ambiente digital, motivadas pelas mais variadas formas de preconceito e facilitadas pelo anonimato dos usuários.

Em relação ao uso em ambientes digitais, um documento publicado pela Fundação Getulio Vargas intitulado Discursos de ódio em ambientes digitais: definições, especificidades e contexto da discriminação on-line no Brasil a partir do Twitter e do Facebook, resultado de uma pesquisa que analisou dados de cerca de 11 milhões de postagens no Twitter e 34 mil postagens no Facebook, afirma que "as mídias digitais facilitam a hostilidade impulsiva, massiva e sem barreiras geográficas".

Expressões encontradas em postagens nas redes sociais que se identificam com a extrema direita revelam intolerância em relação àqueles que não compartilham ou não aderem às suas posições políticas, criando condições para a violência ao transformar adversários políticos em inimigos.

Uma questão relevante é identificar quais estratégias podem ser adotadas para desarticular as discriminações on-line. Que medidas de prevenção são eficazes para coibir a ocorrência do discurso de ódio ou mitigar seus efeitos e limitar seu alcance?

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos estabelece que a apologia ao ódio racial, nacional e religioso constitui crime legalmente punível. Em todos os países, os grupos alvo de discursos de ódio são, em sua maioria, minorias em situação de vulnerabilidade social e econômica.

No direito penal brasileiro, o artigo 20 da Lei nº 7.716/1989 criminaliza condutas que podem ser consideradas discursos de ódio, como o induzimento e a incitação à discriminação ou ao preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, bem como a injúria que utilize referências à raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou com deficiência (artigo 140, § 3º, do Código Penal).

Este é o caminho: punir aqueles que utilizam as redes sociais para propagar discursos de ódio e incitação à violência. Não se pode nem se deve aceitar conteúdos que ataquem indivíduos ou grupos com base em raça, etnia, nacionalidade, orientação sexual, posicionamento político, religião, entre outros.

A Constituição de 1988 garante a livre manifestação do pensamento como um dos direitos fundamentais, mas tais direitos não são absolutos quando outros direitos são violados ou ameaçados.


*Homero de Oliveira Costa é professor titular de Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e autor, entre outros, dos livros A insurreição comunista de 1935 (Ensaio/SP e Editora da UFRN), Dilemas da representação política no Brasil (UFPB), Democracia e representação política no Brasil (Sulinas, RS), Crise dos partidos políticos (Appris,PR), e o Triunfo da pequena política (CRV,PR).

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